LIVRO DA SEMANA
- O livro que recomendo hoje é o tão aclamado "Feras de Lugar Nenhum"(Beasts of No Nation) de Uzodinma Iweala, um jovem autor de 24 anos. Para dizer a verdade, estava eu na seção de literatura africana numa livraria em Niterói e assim que peguei o livro lembrei da história do LRA(Lord's Resistance Army) de que tanto falo aqui no blog. Foi certeiro.
O escritor, de origem nigeriana, mescla uma estilística que ora impõe credibilidade(já que a história é contada por uma criança) e ora denota uma simplicidade textual de causar tédio.
Começa assim: Agu, a criança que vivia muito bem com sua família religiosa em algum lugar no oeste da África, é arrastado para longe de sua mãe, pai e irmã no meio de uma guerra que ele nem sabe o motivo. Acaba aliciado por um grupo de rebeldes e é obrigado a virar soldado para não morrer. Até aí, a trama tinha me seduzido. Mais uma vez volto a dizer que era muito semelhante aos contos que até expus aqui no blog sobre as vítimas do LRA.
- O livro é curto: 191 páginas. O ritmo é frenético, tudo descrito no tempo verbal do presente do indicativo, e muito gerúndio. Há expressões interessantes que Uzodinma(foto ao lado) mistura como "wahala", "juju", "rappa"(que é uma espécie de roupa), e assim você, leitor, realmente percebe que foi empenhado um esforço para caracterizar a linguagem africana. Outro exemplo que você vai notar é a, senão excessiva, repetição dos verbos, mas tal artifício desempenha o processo de identificação ímpar que o autor quis passar à respeito da narração.
- De modo geral, o livro mereceu o prêmio Young Lions para ficção, as boas críticas do Time Magazine, The New York Times, Entertainment Weekly, The Times e do Rolling Stone. Mas, sinceramente, eu achei que Feras de Lugar Nenhum decepcionou em certos momentos. Quem vai acompanhando o livro atentamente percebe que é introduzido a uma personagem (Agu) que possui uma vontade admirável de querer aprender, tanto que é o aluno mais precoce da sala, o melhor do esporte no colégio, e de repente é tão facilmente "abduzido" por um grupo que corrompe tudo aquilo que tinha aprendido. E assim, o leitor vê Agu sendo arrastado por toda a perversidade que o ser humano é capaz de causar, e tudo isso sem nenhuma indagação do tipo: "Qual é a causa dessa guerra?" "Como poderia parar?". E você realmente torce por esse garoto, sabe que ele é inteligente e sensível, todavia ele vira um monstro horrível, de um menino que frequentava a igreja fielmente com a mãe a um menino que mata uma menina de forma grotesca. A transição é brusca, parecendo infundados alguns comportamentos, e ainda assim não consegue odiar Agu.
- Acho que Uzodinma Iweala se esforçou tanto em tornar a narrativa algo realmente feito por uma criança, que acabou, na minha opinião, deixando o pequeno Agu desconexo, sem questionamentos que, sim, uma criança seria capaz de fazer e não somente um adulto. E fora isso, certas partes realmente chocantes me fizeram questionar se o livro conseguiu ter tamanha repercussão pela qualidade literária ou pelo teor das cenas protagonizadas por uma criança. Vale à pena comprar o livro e tirar a dúvida por si próprio. Então, aqui está a dica da semana.
Essa foto ao lado é de Peter van der Houwen. À esquerda está Ajecka, 14 anos, com sua irmã Pipiino, 12. Os dois foram capturados pelo LRA (Exército de Resistência do Senhor) e forçados a se tornarem soldados. Têm pessoas que compram livros como Feras de Lugar Nenhum, se comovem, lamentam a história com os amigos e se preparam para ler o próximo best-seller. É preciso estudar a realidade e se importar de corpo e alma, pois enquanto você lê para tentar compreender, essas crianças sentem na pele a dor de serem ignoradas pelo resto do mundo.
Um comentário:
Olá!
Aqui é uma grande admiradora do seu blog,a cada visita,me surpriendo da capacidade de elevar meus conhecimentos através desse blog.
Por tudo isso,meus incansável PARABÉNS ARCANJO DE PRATA!
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